21 de nov. de 2007

fragmento IV

"Ele a observava dormir, da segurança de seu cigarro à beira da cama. Refazia seus contornos, suas curvas, seus caminhos. Sabia de cabeça como havia chegado até alí. Depois disso, do amanhã, não sabia. Havia aprendido a viver e não querer saber. Apenas ouvia a chuva e a observava dormir, aboletado na segurança de seu cigarro. A fumaça se perdia no rumo da luz. Sessenta watts de luz.

-- Hummm... Oi... -- ela acordou.
Ele sorriu, boca torta segurando o cigarro. Nu por trás da fumaça.
-- Você estava me olhando dormir? Assim eu fico com vergonha.
Ele continuou sorrindo enquanto se levantava. Alcançou o copo de absinto que esquentava sobre a estante e voltou para a cama.
Falou -- Estava pensando naquele dia que você cantou para mim.
-- Eu estava bêbada -- cortou ela. -- não canto mais. -- espreguiçou, trazendo seus braços e seus seios para a luz.
Ele apenas assentiu com a cabeça, olhar distante nos olhos voltados para ela.
Ela olhou em seus olhos por alguns segundos, e voltou a se virar para dormir.
-- Você pode não cantar mais, mas aquele momento em que você cantou agora é meu.

Apagou o cigarro no cinzeiro. Apagou a luz. Sentou-se novamente na cama e olhou para ela, iluminada pela lua que escapava das cortinas e desenhava sobre seu rosto. Lua inteira. Tudo inteiro, mesmo que feito em mil pedaços de luz na escuridão.
Deitou-se e demorou a dormir, mas estava feliz. Teria medo do amanhã se não tivesse aprendido a viver o hoje.

Nada mais é o mesmo depois que você ama. Nada se perde. Tudo flui."


Mais um fragmento de palavras em meio ao silêncio.
Talvez um dia eu o costure a uma história, ou o use para remendar algum buraco de alma.

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1 Comments:

Blogger Dora nascimento said...

Uma noite, sem lua,
Eu semi-louca,
Semi-nua,
Me despi de todas,
Me (re)vesti de mim,
E dançei, sim...
Na sala vazia
Dançei sob doce melodia,
A luz do lume, cega
Dos olhos do homem
Que (me) nega
O amor que eu dei...
A canção me consome,
O olhar me inflama,
E toda a dor é chama,
Envolvendo a minha pele,
Em feitiços e desejos,
Do abraço não recebido,
Do beijo coibido,
Resumido a sobejos,
De tudo o que sou e sei..
E apenas para ele eu dançei.
E, se ele se materializasse,
E entre um sorriso
E um trago, brasa ardendo...
Ele enfim me pertencendo,
Me pedisse,
Eu, sempre (des)obedecendo,
Talvez, eu mais uma vez,
Para ele dançasse,
Como uma noite, eu dançei.

12/28/2007 11:07:00 PM  

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