fragmento de "Uma casa morrendo"
"(...)Rosa está em silêncio. Olha para a televisão como se ela não estivesse lá. Suspira profundamente, quase que com um susto. Olha para o sol que espreita pelas persianas fechadas da sala. Está tão abafado! Levanta-se e caminha até a janela. A onda de luz que invade a sala quando as persianas são levantadas é física, faz balançar o corpo leve de Rosa. Ela olha para a rua lá fora. Carros passam devagar, e tudo parece silencioso neste amanhecer de domingo. Rosa volta a sentar-se. Não vê mais a televisão, ou a poeira no ar. Rosa tem um vislumbre da infância, brincando na rua de pedras desiguais. Lá ela também vê o sol, mas ele ilumina toda uma vida que ainda a esperava pela frente. Agora Rosa já sabe como é viver uma vida inteira. O barulho de um prato quebrando na cozinha a desperta por um momento. Rosa sente uma certa tristeza de ter sido trazida de volta de sua infância. Suspira novamente, devagar e com dificuldade, enquanto os raios de sol dançam.Um trecho de um de meus contos malquistos, chamado "Uma Casa Morrendo".
Pegar os cacos do prato quebrado é um esforço que Emílio preferia não fazer. Mas, quem mais iria fazê-lo agora? Varre todos os cacos para o canto com a vassoura escura, e abaixa-se então para reuní-los no bojo da pequena pá de lixo. Os fragmentos de louça fazem barulhos desarmônicos suaves enquanto são arrastados pelo chão, para sobre a pá. Caminha até o cesto de lixo na área de serviço e despeja os cacos. Caminha de volta até a pia. Sente-se cansado, os joelhos doem mais. Termina de lavar a louça. Volta para a sala. Rosa parece dormir, com a cabeça que pende suavemente para trás e para o lado no sofá estofado com rosas cor de creme. Emilio olha para os raios de sol dançando no chão de taco. Respira fundo e sente-se repentinamente muito tranquilo. Sente uma presença familiar, ainda assim profundamente estranha. O cheiro de rosas no ambiente dá a ele um recado que ele não sabia qual era, mas que entende prontamente. Olha novamente para Rosa, e entende então que o momento chegou.(...)"
Como este conto claustrofóbico dificilmente verá a luz em breve, resolvi deixar que respire um pouco, ao menos em parte, por aqui...
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